A evolução tecnológica da
arte Cristina Jacó em Teoria do Design
Em linhas
gerais, a atividade artística sofreu e continua sofrendo grandes influências
tecnológicas ao longo da história da humanidade. A arte está tão ligada aos
avanços tecnológicos quanto qualquer outra área do conhecimento humano. À
medida que novas formas de trabalho surgem, a atividade artística sofre uma
evolução considerável.
A idade das cavernas
Os
desenhistas e pintores do paleolítico não detinham mais que barro, tonalidades
diferentes de areia, musgo, ceras de plantas e uma ou outra tintura natural
para produzir seus desenhos em cavernas e rochas. Depois, com a idade da pedra
lascada (no período Neolítico), junta-se a esse universo de meios de produção a
sabedoria de criar pequenas peças, ferramentas de: raspar, cavar e esculpir
objetos.
Mais
tarde, percebendo a diferenciação entre os materiais naturais: “uns são duros e
por isso devem ser usados para furar e raspar os mais moles”, as madeiras
passam a serem percebidas e usadas segundo suas propriedades de rigidez,
flexibilidade, tonalidade e resistência. O mesmo ocorre com o carvão, o barro e
as ligas de metal. A partir daí a produção artística passa a ser feita em peças
monumentais e também pequenas esculturas que conseguiram chegar aos dias de
hoje, para nosso deleite.
A descoberta da Escrita
Com o
desenvolvimento da expressão escrita, os artistas passaram a criar com textos.
Os desenhos, ilustrações, explicações e doutrinas se tornaram parte do universo
de produção de arte. Podemos ver isso nos pergaminhos egípcios, por exemplo.
Nas
civilizações egípcias, na Grécia antiga e na civilização romana, a evolução do
pensamento humano, passa a tratar as artes com maior refinamento, mais técnicas
produtivas foram empregadas nas construções. Nesse momento era comum o uso de
pinturas em porcelanas, desenho em papyrus, gravações em couro, tecelagem com
fibras tingidas, afrescos nas paredes, relevos e frisos arquitetônicos, além da
escultura em mármore típica da arte grega e romana. Na China, já se empregava o
uso do papel e da tinta nanquim com pincéis de bambu.
Os avanços do Renascimento
O
movimento artístico e científico dos sécs. XV e XVI, que valorizava os aspectos
humanistas, considerava o homem como medida para todas as coisas. Os avanços
tecnológicos dessa fase contribuíram muito para o aperfeiçoamento da atividade
artística. São originários desse momento histórico a técnica de desenho de
perspectiva linear, o uso da perspectiva aérea (que estuda a interferência das
massas de ar a longas distâncias), a pintura a óleo e o uso da tela como
suporte para pintura.
A impressa (Guttemberg 1465)
Grande
avanço aconteceu quando o artista pode criar suas peças e reproduzi-las em
escala, para uma audiência muito maior. Aliada a esse avanço outras práticas
artísticas, como a litografia, a xilogravura, a serigrafia, a tipografia móvel
e o aperfeiçoamento do livro contribuíram para o surgimento de muitos outros
meios de produção artística, por exemplo: as técnicas de gravura em metal, a
reprodução em off-set, as atividades profissionais de: ilustrador, capista,
cartazista, tipógrafo, impressor e hoje o designer gráfico.
É
incrível imaginar como os cartazes e obras de comunicação de massa, poderiam
ser feitos se não houvesse o poder de reprodutibilidade da imprensa. Acredito
que não seja possível se falar em audiência de massa, por conta de não ser
possível até então, produzir uma peça de comunicação em escala industrial. Um
cartão, por exemplo, pintado por um artista em 1400, antes do advento da imprensa,
não alcançaria um público muito grande, visto que seu artista teria que fazer a
mesma peça manualmente várias vezes, se desejasse disseminá-la para um número
maior de pessoas. Toulouse-Lautrec, grande cartazista em litogravura por volta
de 1897, não conseguiria uma tiragem maior que trinta unidades, ou mesmo quinze
unidades do mesmo cartaz impresso um a um, caso não empregasse as técnicas de
reprodução da imagem que já estavam a seu alcance.
Foi com
as possibilidades da imprensa que as artes se expandiram e puderam ser vistas,
lidas e apreciadas. Chegando ao conhecimento de populações menos esclarecidas
em várias partes do mundo. Por isso grandes artistas, como William Turner, com
ampla visão comercial, faziam questão de conseguir reproduzir seus desenhos em
anuários e com isso conquistar públicos que não podiam chegar até suas
pinturas, expostas em uma galeria de Londres.
Também,
por causa do surgimento dessas tecnologias: a escrita, a imprensa, o livro e
tantas outras, iniciou-se um processo de cisão no universo artístico. Passou-se
a falar de Arte, com “A” maiúsculo, e “artes aplicadas” (como se fossem menos
dignas). Uma diferenciação teórica, técnica e conceitual da atividade de
criação. Enquanto um artista: desenhista, pintor, aquarelista ou escultor não
poderia jamais, manualmente, reproduzir sua obra para atender a uma clientela
maior, os artistas das artes aplicadas comerciais podiam executar trabalhos
para um público significativo. Mas o maior de todos os embates teóricos sobres
essas duas vertentes da prática artística fica a cargo do tipo de mensagem a
ser passado por essas obras. Ao que parece um artista tradicional tem mais a
comunicar do que um artista comercial (o que é questionável). E a reprodução de
peças de arte fez com que uma cópia tivesse preço muito menor que a obra única
e original. Esses questionamentos vêm há anos perturbando e colocando legiões
inteiras de artistas frente a frente. Uns se considerando mais importantes do
que os outros.
A fotografia (Niepce 1822)
Até
surgir mais um grande invento moderno: a fotografia. Essa não só mudou os rumos
da arte, como contribuiu ainda mais para acalorar as discussões filosóficas no
meio artístico. Quando a máquina fotográfica surgiu e a fotografia passou a ser
usada com mais eficiência, em substituição aos retratos pintados a óleo, a arte
sofreu duros questionamentos. “Porque fazer uma pintura de retrato se uma
máquina em muito menos tempo poderia substituir o trabalho do pintor?” Por um
tempo alguns teóricos chegaram a decretar a morte da pintura. Até grandes
gênios artísticos se posicionarem brilhantemente noutro sentido. “Nós não vamos
disputar com a perfeição da máquina” na verdade ela fazer esse trabalho de
reprodução fiel da realidade, tão perfeito e tão rápido, nos liberta para procurar
outras formas de expressão que vão além da máquina. E assim surgiram escolas
como: o Impressionismo, o Expressionismo, o Futurismo, e tantas outras
correntes artísticas que elevaram o trabalho artístico além das potencialidades
da máquina. Assim, todas as tecnologias, embora se influenciassem, puderam e
podem coexistir até hoje.
A informática
Mais uma
vez, ao longo da história artística da humanidade, a máquina vem facilitar o
trabalho e criar mais opções técnicas de produção. A utilidade do computador
para criar arte é inquestionável, ele passa a fazer parte da paleta do artista,
assim como são os seus: pincéis, tintas, papéis, telas e lápis. Antes de usar o
computador para criar, se um artista errasse, teria que refazer todo o
trabalho, perdendo tempo e desperdiçando material artístico caro. Desenhando no
computador basta desfazer um ou mais passos teclando alguns atalhos.
A Internet
Em
extensão ao que a imprensa provocou, a Internet eleva a disseminação das
publicações impressas consideravelmente. Esse novo meio de comunicação
influencia e distancia gerações, há aqueles que são adeptos das tecnologias de
informação e comunicação e há aqueles, que mesmo tendo nascido em meio à era do
conhecimento, se mantém à parte desse universo.
O
computador munido de softwares gráficos e as fontes de informação existentes na
Internet contribuem para uma forma de criar arte sem grandes gastos materiais
(e supostamente sem perdas, a não ser de tempo), pois o que se cria no
computador e publica na Internet é arte não tátil (não é possível pegar, não
tem cheiro e o artista não se suja de tinta). O universo digital transformou o
atelier em um estúdio limpo, abrindo um mundo paralelo, rico de experiências e
infinitamente poderoso para os trabalhos artísticos. Um universo ilimitado e de
descobertas extraordinárias.
E o que aconteceu com as artes ao longo de todas
essas transformações tecnológicas?
É visível
a influência e a troca produtiva entre a Arte e a Tecnologia. A cada advento
tecnológico, as atividades artísticas se adaptaram se modificaram e até
surgiram novas atividades ligadas às artes e que fazem uso dessas tecnologias,
como: designers gráficos, fotógrafos, webdesigners e tantos outros tipos de
profissões artísticas. Mas uma coisa parece ser constante ao longo de todo esse
fervilhar de novas propostas produtivas: a mensagem. Ainda que surjam muito
mais opções materiais de se criar arte, a mensagem a ser transmitida ainda é de
responsabilidade do artista, e a ele cabe saber o que dizer e como dizer. Por
isso se enriquecer culturalmente para ter o que falar com seu lápis, ou com seu
Photoshop, Corel, etc.; seja para o seu blog ou para uma agência, é de
fundamental importância.
Hoje,
para todos nós artistas, sejamos tradicionais: pintores, desenhistas,
escultores; ou digitais: fotógrafos, designers, webdesigners, animadores, etc.
o importante é o conteúdo e não apenas o primor técnico. Pois a técnica evolui,
novos processos produtivos surgem, novos softwares são inventados, pipocam
novas versões a cada ano, mas isso tudo se aprende e se adapta para o uso das
artes.
A técnica
de hoje pode não ser mais a técnica em voga amanhã, por isso é preciso ir além
das limitações materiais para ser um verdadeiro artista. É preciso mais do que
nunca se alimentar com conhecimento e experiências enriquecedoras, porque as
técnicas embora sejam de grande utilidade, não são as mesmas sempre. E a
sabedoria adquirida com a prática de uma técnica produtiva, o desenho ou a
pintura, por exemplo, gera grandes resultados ao se migrar para um modo de
fazer arte digital. Tudo isso é conhecimento adquirido, é preciso saber um
pouco de cada técnica e se manter alimentando de novos saberes.